A simbologia das identificações preconceituosas
umarmadeira
ARTIGO DE GUIDA VIEIRA
Há muita gente que não olha para os símbolos que identificam os sexos com um olhar crítico, ou criterioso, como se queira chamar. Até acha graça na forma como alguns deles estão construídos, e considera as nossas críticas ridículas ou “fofoquices politiqueiras”.
No entanto, eu aprendi ao longo da minha vida que nada acontece por acaso. Por detrás de uma imagem ou de um símbolo, está um significado e um objetivo.
Quando no chão dos parques de estacionamento ou nos fraldários das casas de banho as identificações para transportar ou cuidar das crianças estão todas com uma conotação feminina, isso quer dizer que ainda existe um preconceito em relação aos homens que deve ser desmistificado, até porque hoje muitos deles já mudam as fraldas e carregam os/as filhas para passear, ou mesmo ao médico e à escola. Não é correto ligar tudo o que se refere às crianças apenas às mães. Não devemos aceitar este estereótipo sem refutar a mentalidade preconceituosa e machista que está por detrás dele. Até a lei mudou de “Maternidade” para “Parentalidade”, exatamente para chamar a atenção que tudo o que se refere aos/às filhos/as tem a responsabilidade de ambos os progenitores.
Claro que sabemos que hoje existem casais do mesmo sexo também com crianças e que devem sentir na pele ainda mais preconceitos. Imagino o dilema de dois pais perante um fraldário que nem tem uma imagem masculina e que fica, muitas vezes, dentro da casa de banho das mulheres. Temos que estar atentas/os a estas questões que parecem pormenores mas que, na realidade, mexem muito com as nossas vidas e o nosso quotidiano.
Também não podemos aceitar como normal que num restaurante a casa de banho das mulheres esteja identificada com “Shopping”, e a da casa de banho dos homens esteja sinalizada com “Futebol”. Há muitas mulheres e homens que não se revêm nem se encaixam nestes rótulos. Sabemos que existem mulheres que gostam de futebol, assim como existem homens que gostam de Shopping. Este tipo de identificação trata as pessoas como “burras” e “fúteis”, quer sejam homens quer sejam mulheres.
Parece uma coisa de pormenor ou de brincadeira, o que não era pois eu própria vi, e mesmo se assim fosse não devemos admitir. Quem me chamou a atenção para este facto foi um homem. Apetecia entrar propositadamente na casa de banho onde nos identificássemos com o interesse proposto. Mas se o fizéssemos, estaríamos a diminuir a importância desta questão.
O mesmo se passa com o nosso cartão de identidade, que trata todas as pessoas no masculino. Dizem que somos radicais, mas eu quando me refiro à minha identidade faço-o sempre no feminino porque sou mulher e não admito que me tratem como homem. Já perguntei a muitos homens: e se fosse ao contrário? Se em vez de ser cartão de cidadão fosse, para toda a gente, cartão de cidadã? Claro que nenhum deles se identifica e fica a olhar, sem qualquer argumento.
E em relação ao cumprimentar no masculino? Será que os homens iriam se sentir representados quando, numa sala antes de um evento, alguém dissesse “bom dia a todas”? Parece que estou a ver o escândalo que seria, sobretudo se a cerimónia fosse pública. Nunca o fiz, mas já me apeteceu fazê-lo várias vezes. Ainda assim, acho que o mais correto é sempre cumprimentar no feminino e no masculino. Os ingleses foram pioneiros quando, desde há muito tempo, utilizam o seu famoso “Ladies and Gentleman”.
Os preconceitos estão tão enraizados nas nossas vidas que muitas vezes somos preconceituosos/as sem sequer termos consciência disso.
É necessária muita atenção e vigilância, porque é nos chamados “pequenos pormenores” que tudo começa.